Por que não teria?
Eu acordo todos os dias com o Sol batendo nas cortinas alaranjadas do meu quarto, minha mãe as pôs com este propósito, mas nem sempre o Sol me desperta antes do meio dia. Respiro e sinto cada molécula de carbono no ar inundando meus pulmões impuros pela bronquite que cada ano piora. Os pássaros cantam, e minha mãe reclama deles, ela acha irritante todos esses trinados, piados, gorgeios e assovios. Abro a janela e nada do cartão postal que mostram na televisão: só um monte de casas, a fábrica que tem as janelas de frente pro meu quarto e o céu azul, quase totalmente limpo e plenamente ensolarado.
Sim, a vista da minha janela. |
Bocejo, e ainda com sono ouço um pouco de música, mas nada de bossa nova. Talvez um pop chiclete, um grunge resmungão, uma baladinha romântica ou algo dos anos noventa para baixo - sim, sou nostálgica . Escovo os dentes e me olho, nem linda nem cheia de graça, mas sonolenta e com os cabelos despenteados.
Tomo um banho - de chuveiro, não de mar, e faço minhas coisas normalmente: tarefas domésticas, almoçar, rir com meu irmão, ver televisão, entrar na internet, lavar a louça, outro banho, um café da tarde, volto para a internet e fico na frente do computador até ser dito 'chega' para mim.
Mas o que me conforta é que eu posso, com um pouco de sorte, dinheiro ou cartão de transporte, sentar em um ônibus, bem cedo, ficar fatigada olhando pras casinhas iguais e chegar, com meia dúzia de amigos pra olhar o mar e sentir essa conexão que acho que mais ninguém em outro estado sente quando o ar salgado invade as narinas, a areia penetra os chinelos e o som do mar ecoa nos ouvidos. Mesmo sem o Cristo de braços abertos, mesmo meu Pão de Açúcar sendo o pão doce da padaria da esquina, mesmo nem todo mundo sendo bonito, legal e simpático, mesmo só tendo visto o Maracanã pela tv, nos jogos do meu Flamengo (que só tá me dando vergonha mas deixa pra lá) ... É o lugar onde eu me orgulho de morar.
Porque TUDO isso é o Rio, de Janeiro à Janeiro. E eu vivo aqui, desde quando nasci.